Modificada, regulamentação da reforma tributária volta à Câmara
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- 1 de outubro de 2025
O Plenário do Senado aprovou, nesta terça-feira (30), o texto alternativo ao projeto de lei complementar (PLP 108/2024) que regulamenta a segunda parte da reforma tributária sobre consumo e outros pontos da Emenda Constitucional 132. O substitutivo do senador Eduardo Braga (MDB-AM) foi aprovado por 51 votos a favor, 10 contrários e 1 abstenção. Modificado, o projeto volta à Câmara dos Deputados.
O texto aprovado regulamenta a governança, a fiscalização e as regras para o funcionamento do novo sistema tributário, criando o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) que vai substituir o principal imposto estadual, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), e o Imposto Sobre Serviços (ISS) municipal. O Comitê Gestor será responsável pela arrecadação e distribuição do novo imposto, que será dividido entre estados e municípios.
A reforma tributária também criou a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), na esfera federal.
Apesar do elevado número de emendas analisadas na Comissão de Constituição e Justiça ( CCJ), 519 mudanças, o relator precisou dar parecer a cerca de 200 novos pedidos apresentados em Plenário ao seu subtitutivo do PLP 108/2024. Braga acatou total ou parcialmente quase 65 das modificações solicitadas. Por conta de todas essas modificações, a Câmara terá que analisar o texto aprovado pelo Senado.
Para Braga, a regulamentação da reforma tributária é necessária para a retomada do crescimento econômico e a geração de emprego e renda.
— O Senado, hoje, está diante da oportunidade de poder marcar historicamente o encerramento de um passo importante da reforma tributária para bens de consumo e serviços (…) Esta é a primeira reforma que o Brasil faz em regime democrático. Portanto, podemos dizer que esta reforma pertence a todos — ressaltou Braga.
O relator destacou que uma das modificações mais importantes da reforma é mudar a tributação da origem para o destino do produto.
Mudanças
Algumas das principais emendas de Plenário acatadas pelo relator buscam atender demandas de estados e municípios. Entre elas, está a atualização do cálculo da alíquota de referência do IBS, que usará dados de 2024 a 2026 — em vez do período de 2012 a 2021, como previa a versão que foi aprovada inicialmente na CCJ.
A calibragem do IBS será feita gradualmente entre 2029 e 2032, com o objetivo de evitar impactos bruscos nas finanças públicas, segundo Braga. Também deverá ser criada, para que haja mais segurança jurídica, a Câmara Nacional de Integração do Contencioso Administrativo, voltada à harmonização da jurisprudência fiscal envolvendo os novos tributos (IBS e CBS).
Braga incluiu, a pedido do senador Nelsinho Trad (PSD-MS), redução de alíquotas para os institutos de ciência, tecnologia e inovação sem fins lucrativos e suas fundações de apoio. Também foi incluído o aumento do teto, de R$ 70 mil para R$ 100 mil, para isenção de imposto no caso de veículos comprados por pessoas com deficiência, emenda apresentada pela senadora Mara Gabrilli (PSD-SP).
Para o líder do governo em exercício, senador Rogério Carvalho (PT-SE), o Brasil terá um dos sistemas tributários mais modernos do mundo, ao contrário do que ocorre atualmente.
O senador Efraim Filho (União-PB) disse que o atual modelo tributário brasileiro “está esgotado”.
— É um sistema arcaico, obsoleto, ultrapassado, que nos joga nas últimas posições no ranking Doing Business, como um dos piores ambientes para se fazer negócio no mundo. Mesmo assim, o empreendedor brasileiro, que é um herói da resistência, não sucumbe a esse manicômio tributário, a esse caos emaranhado de leis e sobrevive. Era missão nossa entregar um modelo mais simples, menos burocrático e que facilita a vida de quem produz — disse Efraim.
Distribuição do IBS
Serão divididos entre os estados e os municípios o valor arrecadado com o IBS e os rendimentos de aplicações financeiras, juros e multas de mora. A divisão do ICMS seguirá os índices vigentes até 2032. Como o IBS só começa a valer de forma plena a partir de 2033, até lá o ICMS e o ISS continuam sendo cobrados normalmente. Em 2032, o que cada estado receber de ICMS servirá de referência para definir quanto ele vai receber do IBS a partir de 2033.
Braga estendeu até 2096 o prazo de vigência do seguro-receita, um mecanismo para compensar perdas de arrecadação para estados e municípios com a reforma tributária. O Fundo de Combate à Pobreza só começará a receber recursos do IBS em 2033.
Plataformas digitais
As plataformas digitais (market places e similares) poderão ser responsabilizadas se não fornecerem ao Fisco ou ao prestador de serviço de pagamento as informações mínimas sobre as operações. O mesmo vale se o fornecedor não emitir documento fiscal eletrônico.
Também está prevista a possibilidade de a plataforma atuar como substituta tributária, com o consentimento do fornecedor, quando ele não emitir a nota fiscal. Nesse caso, caberá à plataforma emitir o documento e recolher o imposto. Se a nota fiscal não for emitida em até 30 dias, a plataforma será obrigada a emitir e a recolher os tributos devidos. A responsabilidade será solidária.
Imposto seletivo
O chamado Imposto Seletivo foi criado pela reforma tributária para atingir produtos que fazem mal à saúde, como bebidas açucaradas, cigarros e bebidas alcoólicas. Braga acatou emenda do senador Izalci Lucas (PL-DF) para limitar a 2% a alíquota máxima sobre esses produtos. O teto não consta do texto aprovado pelos deputados federais. O tributo será introduzido de forma gradual de 2029 a 2033.
Alguns senadores criticaram o limite de 2% de Imposto Seletivo para as bebidas açucaradas, como os refrigerantes. O senador Humberto Costa (PT-PE) disse que esse tipo de imposto é usado em muitos países desenvolvidos por acarretar aumento de arrecadação aliada à promoção da saúde pública. Com imposto mais alto, disse o senador, haveria redução do consumo de produtos que contribuem para obesidade, pressão alta e outros problemas crônicos de saúde.
— Muitos desses produtos, especialmente as bebidas açucaradas, são causas importantes de doenças graves, doenças crônicas e que têm um elevadíssimo custo no seu tratamento para o serviço público de saúde, para o Sistema Único de Saúde — afirmou Humberto, que foi ministro da Saúde.
O senador Eduardo Girão (Novo-CE) também criticou o teto para o imposto sobre bebidas açucaradas. Ele disse que esse tipo de produto — e os alimentos ultraprocessados — causam danos à saúde da população. Girão criticou o projeto como um todo.
— O PLP 108, de 2024, concentra um excessivo poder em um órgão nacional único, reduzindo a autonomia federativa e abrindo espaço para disputas políticas na gestão de receitas. A centralização ameaça a concorrência fiscal saudável entre entes, aumenta a burocracia e enfraquece o controle social sobre a arrecadação. Além disso, amplia a insegurança jurídica ao alterar simultaneamente múltiplos tributos, criando riscos para empresas e investidores — afirmou Girão.
O senador Omar Aziz (PSD-AM), por sua vez, disse que o leite condensado tem mais açúcar que um refrigerante.
— Nenhum produto da Nestlé está no imposto seletivo, nenhum, e ninguém falou nada sobre isso. Ou será que o Leite Moça, o leite condensado, não é mais açucarado do que qualquer outra bebida? (…) A Nestlé tinha que estar no imposto seletivo — disse Omar.
A senadora Mara disse que “a obesidade ultrapassou a fome no planeta”.
— A gente está falando de um produto que criança consome, processados, bebidas (…) se a gente mantiver essas pessoas com saúde, o SUS vai ter muito menos despesa mais tarde com diabetes e com outras doenças causadas pelas bebidas açucaradas — afirmou a senadora.
Split payment
O texto regulamenta um mecanismo novo na legislação tributária, o split payment, pelo qual o valor do imposto devido em uma transação de IBS ou CBS é separado automaticamente no momento da compra: uma parte vai direto para o vendedor e outra parte segue imediatamente para o governo. Isso reduz a possibilidade de sonegação e garante que o recolhimento ocorra no ato da operação.
Se a plataforma ou o prestador não separar ou não repassar corretamente o valor do tributo, poderá ser punido. As penalidades incluem multa de R$ 20 por transação, multa de mora mensal de 3% sobre valores não repassados ou repassados com atraso, e multa de R$ 0,20 por transação em caso de atraso na comunicação. A prática reiterada destas infrações por instituições de pagamento poderá levar à suspensão ou cassação da autorização de funcionamento pelo Banco Central.
Cashback
A arrecadação de IBS e CBS será ajustada para considerar o cashback (devolução tributária para contribuintes de baixa renda), outra novidade da reforma. O mesmo vale para as alíquotas diferenciadas e para o crédito presumido (benefício que permite a uma empresa reduzir o imposto a pagar sem ter que comprovar todos os custos ou tributos já pagos).
O texto também ajusta o cashback para viabilizar a devolução em operações com gás canalizado no regime monofásico, mesmo sem destaque do tributo no documento fiscal. Durante um período de transição, parte da receita será progressivamente retida para compensar perdas dos entes federativos.
Heranças
A proposta uniformiza a cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), que hoje tem normas diferentes em cada estado. Pelo texto, cada ente federado poderá definir as alíquotas, mas um limite máximo será fixado pelo Senado.
A progressividade do imposto é obrigatória, ou seja, quem herda mais paga alíquota maior. Emenda acatada pelo relator exclui da base de cálculo do ITCMD os benefícios de planos de previdência privada complementar.
Entre as regras definidas para o ITCMD, o relator manteve a imunidade para entidades religiosas, partidos políticos, sindicatos e ONGs sem fins lucrativos, com possibilidade de suspensão caso haja indícios de fraude. O texto também ajusta a base de cálculo do imposto sobre bens financiados, consórcios e participações em empresas não listadas em bolsa.
A proposta elimina a aplicação automática da alíquota máxima para grandes patrimônios e prevê aplicação por faixas. Foi incluída a incidência sobre transmissões e doações via trust — mecanismo que permite a administração de bens por um terceiro em favor de um ou mais beneficiários. Na regulamentação, a cobrança do tributo deverá ocorrer no momento da transferência dos bens ou do falecimento do instituidor.
Imóveis
No caso do Imposto Sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), a cobrança deverá ocorrer preferencialmente no momento do registro da escritura do imóvel. Mas o texto autoriza que municípios adotem alíquotas menores se o contribuinte optar por pagar no ato da assinatura da escritura em cartório.
A base de cálculo é o valor de mercado do imóvel à vista e em condições normais, definido por critérios como preços de mercado, localização e dados de cartórios e agentes financeiros. Contribuintes poderão contestar o valor atribuído por meio de comprovação técnica.
Iluminação pública
O projeto regulamenta ainda uma possibilidade prevista na reforma tributária sobre a Contribuição para Iluminação Pública (CIP). De acordo com a Emenda 132, os municípios podem usar a CIP para financiar sistemas de monitoramento e segurança urbana — como câmeras de vigilância, centros de controle, tecnologias e infraestrutura. A medida poderá provocar aumento do tributo.
Fiscalização
Durante o período de transição para o novo modelo de incidência do IBS e da CBS, a fiscalização tributária terá caráter pedagógico. Em caso de auto de infração por descumprimento de obrigações, o contribuinte será intimado para suprir a omissão em 60 dias, o que resultará na extinção da penalidade imposta, incentivando a conformidade tributária.
O projeto também altera as regras sobre multas: a multa de ofício sobe para 100% em casos de fraude, simulação ou conluio, e para 150% em caso de reincidência. Por outro lado, cai para 50% se o erro for apenas de valor declarado a menor, com todos os dados presentes. Multas por obrigações acessórias são unificadas, e as reincidências sofrem aumento de 50%.
Comitê Gestor
O texto aprovado regulamenta o Comitê Gestor do IBS (CG-IBS). O órgão é uma entidade pública de regime especial, com independência técnica, orçamentária e financeira. Embora o comitê tenha a atribuição de coordenar a arrecadação, a fiscalização, o lançamento, a cobrança e a inscrição em dívida ativa do imposto, algumas atribuições serão mantidas sob a responsabilidade de estados, Distrito Federal e municípios.
A instância máxima do CG-IBS é o Conselho Superior, composto por 54 membros (27 indicados por estados e Distrito Federal e 27 eleitos pelos municípios). As decisões exigem maioria absoluta e, no caso de estados e Distrito Federal, o voto dos conselheiros que representem mais de 50% da população nacional.
O órgão deve contar ainda com diretoria-executiva, corregedoria, auditoria interna e assessoria de relações institucionais. A presidência e a vice-presidência são assumidas alternadamente por estados e municípios. A ouvidoria tem três representantes da sociedade civil.
Os prefeitos votam para escolher os representantes que vão compor a cota municipal no conselho, sendo que cada município tem direito a um voto. Após a formação do colegiado, é realizada a eleição para a presidência e as duas vice-presidências.
Cada grupo de representantes (União; estados e Distrito Federal; e municípios) pode apresentar candidatos. Os próprios membros do conselho votam para escolher o presidente e os dois vice-presidentes, sendo um vice-presidente representando a União, e outro, os entes federados. São reservadas 30% das vagas de liderança para mulheres.
Escolha de representantes
Uma das emendas acatadas pelo relator disciplina a escolha dos representantes dos municípios no Conselho Superior. Em vez de exigir um apoiamento mínimo das chapas apresentadas pela Confederação Nacional de Municípios (CNM) e pela Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP), Braga optou por deixar a cargo das duas instituições a elaboração de um regulamento eleitoral para os cargos. Mas a chapa vencedora deve angariar votos correspondentes a pelo menos 30% do total de municípios ou da população do país.
Pela proposta, o CG-IBS e a Receita Federal podem dar orientações ou emitir pareceres quando contribuintes ou administrações tributárias pedirem esclarecimentos. As orientações têm efeito obrigatório para quem pedir e para os órgãos que administram tributos. A consulta não suspende os prazos legais — ou seja, não interrompe nem atrasa os prazos.
Financiamento
Durante a implantação (entre 2025 e 2028), a União financia o CG-IBS com até R$ 3,8 bilhões. Depois, o comitê será custeado por percentuais decrescentes da arrecadação do IBS: de 100%, em 2026, até 0,2%, em 2032.
O senador Braga deixou claro no substitutivo que só o CG-IBS pode criar obrigações ligadas ao tributo. Ele reduziu de quatro para dois anos os mandatos dos dirigentes e incluiu a sociedade civil nas avaliações periódicas do comitê. Além disso, definiu normas mais rígidas para evitar conflitos de interesse e estabeleceu critérios de proteção jurídica aos membros do conselho.
Controle externo
Os Tribunais de Contas deverão fiscalizar o orçamento do CG-IBS. Se o orçamento proposto for rejeitado, o comitê pode usar parte dos recursos de forma provisória enquanto se resolvem os impasses. Relatórios de arrecadação terão que ser divulgados à sociedade e o Senado fixará o limite da dívida que o CG-IBS poderá assumir.
Processo administrativo
Será criada a Câmara Nacional de Integração do Contencioso Administrativo do IBS e da CBS. Caberá ao novo órgão uniformizar as teses sobre o IBS e a CBS, e o contribuinte pode acioná-lo contra decisões irrecorríveis do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e do próprio CG-IBS. Os julgamentos serão 100% eletrônicos. Os prazos serão contados em dias úteis.
Créditos de ICMS
O projeto também define o futuro dos créditos acumulados de ICMS com a extinção do tributo a partir de 2033. De acordo com o texto, as empresas poderão:
- usá-los para compensar débitos de ICMS, se autorizado pelo estado;
- compensá-los com o IBS;
- transferi-los a terceiros para uso em ICMS ou IBS; ou
- solicitar ressarcimento em até 240 parcelas mensais (Se houver crescimento real da arrecadação do IBS, os estados podem antecipar o pagamento das parcelas a partir de 2034).
Desoneração
Haverá desoneração dos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios, que juntam dinheiro de vários investidores para comprar créditos que empresas têm a receber. Eles são classificados como entidades de investimento da incidência do IBS e CBS. Fica ainda autorizada a apropriação de créditos e o estorno de débitos por fornecedores ou compradores nos casos de devolução ou cancelamento de operações.
Futebol
Braga também acolheu emenda do senador Carlos Portinho (PL-RJ) em prol das Sociedades Anônimas do Futebol (SAFs), com redução de 4% para 3% da alíquota dos tributos federais unificados. Também haverá redução de 1,5% para 1% da alíquota da CBS e de 3% para 1% da alíquota do IBS.
As receitas decorrentes da cessão de direitos desportivos de atletas, bem como da transferência ou retorno de atletas a outras entidades desportivas serão excluídas da base de cálculo do Regime de Tributação Específica do Futebol (TEF) nos cinco primeiros anos-calendários da constituição da SAF.
Combustíveis
Braga incluiu uma mudança inspirado em emendas de Izalci Lucas, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), Weverton (PDT-MA), Luis Carlos Heinze (PP-RS), Mecias de Jesus (Republicanos-RR), Jorge Kajuru (PSB-GO) e Professora Dorinha Seabra (União-TO). O objetivo é coibir a fraude e a evasão fiscal no setor de combustíveis.
— A inclusão das “correntes” de gasolina e diesel na sistemática de tributação monofásica do ICMS, além de fortalecer a segurança jurídica, alinha a legislação estadual com a da Cide-Combustíveis, o que promove maior coerência no sistema tributário nacional — explicou Braga.
Fonte: Agência Senado
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